Se a liberdade significa alguma coisa, será sobretudo o direito de dizer às outras pessoas o que el

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"Quem não reage, rasteja"

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Falar sem pensar


RETRATO DA CULTURA NA 56° FEIRA DO LIVRO EM PORTO ALEGRE/RS

   Enquanto eu estava fazendo a minha performance, na Praça da Alfândega, fui cercada por aproximadamente dez policiais e retirada de lá contra a minha vontade.
   Os policiais primeiro me levaram para fora da Praça, longe das luzes da Feira, acompanhada pelos brigadianos e duas motos, na presença de um grande público, amigos, leitores.
   Perguntei o que estava acontecendo e disseram que eu precisava me identificar.
   Depois me pegaram pelo braço e me puseram dentro de uma viatura com quatro policiais. Perguntei o que estava acontecendo e me disseram que eu estava sendo levada para fazer exames médicos. Eu chorava copiosamente pensando que, diante do público da Feira, eu era tratada como uma doente mental, bandida, criminosa, perturbadora da paz. E sem entender o que estava acontecendo, o que fiz de culpável.
   Não fizeram qualquer exame. Apenas aguardei até que o vice-presidente da Feira chegou na delegacia e conversamos. Eu falei o óbvio: que a imagem poética é plurissignificativa, eu estava realizando uma manifestação artística, apenas, e em nenhum momento compreendi qual o crime que eu estava cometendo e nem o porque de ser retirada dessa forma.
   Eu quis apenas expressar sentimentos relacionados à vivência que tive nos últimos meses, quando acumulei muitas contas e tive que deixar o apartamento onde morava. Formei com as contas uma imagem poética em três dimensões, pus meu corpo em cena e utilizei alguns objetos cênicos.
   O público parece ter se identificado, pois foi muito receptivo e acolhedor. Foi por causa dele que fiquei até o fim. Agradeço às pessoas que se manifestaram apoiando-me e inclusive revoltando-se com aquela situação.
   O público leitor. Foi para encontrá-lo que fiz minha performance. Ela não incentiva a leitura? O vice presidente da Câmara disse que o objetivo da Feira é incentivar a leitura, quando o perguntei.
   É para o público que eu escrevo e pretendo escrever o melhor possível. Ainda que, às vezes, seja difícil encontrar um lugar adequado para isso.
   Estou chocada e sem compreender o porque de toda essa truculência com uma escritora em praça pública. Ora, uma escritora conversando com o público em um evento literário de repente tem de ser retirada dessa forma, como se estivesse cometendo crimes hediondos? Cada um interpreta uma performance à sua maneira, se o chapéu caiu certeiro na consciência de quem se incomodou com a minha presença, não posso fazer mais do que dizer: essa interpretação é sua.
   O pior foi ter de interromper a minha performance. Eu estava em cena. Já fui contratada tantas vezes para fazer performances de poesia pelos próprios promotores do evento. Se buscarem os guias da Feira dos anos anteriores verão que estive na programação de 2009, 2008, 2007... Em 2010, não enviei propostas de atividades simplesmente porque, no ano passado, cansei demais. Convidaram-me para o Feira Fora da Feira, aceitei, e estou fazendo performances nas comunidades, aos sábados. Já estive na Lomba do Pinheiro, na Tristeza e amanhã, abalada moralmente, humilhada e entristecida, irei até o Morro da Cruz cumprir a atividade do Feira Fora da Feira.


Por que fui calada?

Telma scherer

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